Quando eu era uma garotinha e me perguntavam o que eu queria
fazer da vida quando eu crescesse, minha resposta era bem simples: Quero
viajar. As pessoas balançavam a cabeça com aquele olhar condescendente com o
qual normalmente olham para as crianças e sorriam, como se eu tivesse dito a
coisa mais boba do mundo.
Conforme
os anos passavam, as coisas mudavam, os cabelos cresciam, os amores se acumulavam,
os sorrisos se multiplicavam, as dores passadas se dissipavam no tempo, e a
infância era deixada para trás, eu mudei, mas aquela vontade, aquele impulso
quase incontrolável de me entregar ao mundo nunca me deixou. As bonecas nas
prateleiras foram substituídas por um mapa na parede, por fotografias de um
mundo inteiro à ser explorado. Sempre
houve algo de inquieto, quase selvagem dentro de mim, que implorava para que eu
vivesse, para que jogasse uma mochila nas costas e saísse sem rumo.
Hoje,
eu sei que esse desejo nunca vai embora.
Na verdade, ele apenas cresce. Cresceu desde a primeira vez em que
entrei em um avião, ouvi a voz mecânica do piloto flutuar dos alto falantes e
ecoar pelas janelas minúsculas. Cresceu quando eu finalmente descobri que nada
se compara à visão das nuvens vistas de cima, uma massa magnífica que deixa de
ser céu e passa a ser um tapete mágico contra o azul insano visto dali, daquela
pequena janela.
Cresceu
quando eu coloquei os pés em uma avenida estreita, cheia de energia e cheia de
vida que levava ao meu hotel no Rio de Janeiro. Cresceu quando naquele mesmo
dia eu desci aquela mesma avenida de mãos dadas com um belo e doce garoto que
seria um romance intenso e único pelos próximos três dias. Cresceu quando eu
beijei aquele mesmo garoto na praia de Copacabana, a areia nos dedos, o odor do
oceano e a brisa levantando meus cabelos. Quando ele sussurrou, baixinho e maravilhado
um ‘’ Você é linda’’ sob as luzes na cidade, que se refletiam no oceano escuro
àquela noite. Cresceu até mesmo quando eu subi a escadaria de um prédio antigo
com aquele romance passageiro, o prédio onde ele trabalhava, e nós observamos
abraçados a cidade à nossa frente, com seus morros altos e sua beleza única.
Descobri
que poucas coisas são mais excitantes que ver as curvas sinuosas da montanha se
curvar enquanto o carro faz seu caminho árduo pela floresta, subindo até o
Cristo Redentor. Descobri que não há nada melhor do que olhar aqueles braços
abertos que parecem abraçar o mundo e respirar fundo aquele ar rarefeito lá em
cima. Descobri que não há nada mais pacífico que caminhar por aquelas praças
peculiares do centro, ouvindo um artista de rua tocar seu violino. Descobri que
às vezes, prédios antigos e pequenos podem ser muito mais bonitos que os aranha
céus nas cidades grandes.
E não
foi só com o Rio que eu aprendi. Aprendi nas fazendas de Minas Gerais que o céu
longe das luzes da cidade é a coisa mais deslumbrante que eu já vi e que jamais
verei. Aquele céu tem o poder de te paralisar completamente, e eu sei, olhando
para ele, que se existe um Deus, é lá que ele se encontra. Descobri também, nos
confins daquela cidade pequenina, que não há comida mais gostosa que comida
mineira, sotaque mais caloroso ou sorriso mais sincero. Descobri que, às vezes,
encher a cara até cair e dançar ao som do locutor conduzindo um rodeio faz bem
para a alma e para o coração, mas nem tanto para o seu fígado.
Aprendi,
ainda, que a Avenida Paulista no Natal se ilumina como que por um passe de mágica,
que aquelas luzes intensas e magníficas podem te deixar de boca aberta.
Descobri que há uma energia quase insana nas grandes cidades, com todas aquelas
histórias se cruzando uma com a outra, com as pessoas apressando-se de um lado
para o outro, me fazendo imaginar para onde elas correm.
E ainda
há tanto a se aprender. Tanto a conhecer. Quero pular de asa delta do alto da
pedra da Gávia, quero ver a Torre Eiffel se iluminar, e talvez beijar um
estanho que eu nunca mais vá ver em frente ao Coliseu. Quero conhecer as
cidades que inspiraram grandes autores, dançar até cair em um clube qualquer em
Londres. E essa é a magia da vida, há todo um universo me esperando, basta ir
até ele.
Muito Charles Bukowski para uma pessoa só��
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